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sábado, 7 de dezembro de 2013

Padre Joaquim Silvestre Serrão



O Padre Joaquim Silvestre Serrão se não foi o maior compositor de música sacra do passado século, foi, sem sombra de dúvida dos maiores. A sua obra notável, que se guarda em original na fidalga e hospitaleira ilha de S. Miguel e principalmente na sua capital, a típica e acolhedora cidade de Ponta Delgada, que o recebeu e glorificou é um autêntico monumento de arte sacra. Sofrendo embora dos efeitos e defeitos da sua época, a obra de Serrão é o primeiro lampejo forte de reacção contra o gosto teatral que invadira os coros dos nossos templos e deles se apoderar. 

Natural de Setúbal, nasceu nesta cidade em 16 de Agosto de 1801, filho do médico-cirurgião António Leocádio Serrão e de sua mulher, D. Ana Luísa da Conceição 

Depois de ter aprendido na sua terra natal, então um meio opulento onde se cultivava a melhor música, os rudimentos da divina Arte, sentindo-se inclinado para a vida religiosa, e também porque desde sempre tivera em vista reformar a música sacra, ingressou na Ordem Militar de Santiago de Espada, que tinha o seu convento-sede no castelo vizinho da vila de Palmela, onde logo ocupou o lugar de Mestre de capela do qual ascendeu a outros benefícios, chegando, depois de ordenado presbítero, a comendador. Extintas as ordens religiosas, o Padre Joaquim Silvestre Serrão teve, como todos os outros, que abandonar o seu convento.

Foi então para Lisboa onde viveu de dar lições particulares nalgumas das mais fidalgas e importantes famílias. Em Rilhafoles, onde permaneceu algum tempo, fez amizade com o Bispo de Angra, D. Frei Estêvão de Jesus, notável espírito de artistas, que foi seu grande admirador, e por isso o convidou para o acompanhar na ida para a sua diocese. Joaquim Silvestre Serrão querendo furtar-se ao ambiente revolucionário que era então o português, acabou por aceitar e abandonou o Continente, recusando mesmo o rendoso e eminente lugar de organista da Sé Patriarcal, então dos mais interessantes para um artista.

Em fins de 1840 o Padre Joaquim Silvestre Serrão, aceite o convite do Bispo dos Açores, partiu para aquele Arquipélago. Como quer que o Prelado se encontrasse em Ponta Delgada, foi para esta cidade que o notável músico setubalense se dirigiu. Aqui, breve conquistou a admiração de todos os micaelenses, que logo passaram a ter por ele e pela sua notável arte a mais devota veneração. D. Frei Estêvão de Jesus nomeou-o então organista da igreja matriz de S. Sebastião, dando-lhe também a capelania do recolhimento de Santa Bárbara. Ao mesmo tempo fazia-se professor de música dos filhos das principais famílias micaelenses. 

Foi então que Serrão compôs a maior e mais valiosa parte da sua obra, que felizmente S. Miguel soube guardar preciosa e ciosamente, essa obra que pôde espantar o grande músico e crítico de arte o Professor Martinho Roeder, redactor da «Gazeta de Milão», depois director do Conservatório de Boston, e que a ela se referiu, na biografia que escreveu, do notável compositor, nos mais elogiosos e expressivos termos.

Vítima de um insulto apoplético, Silvestre Serrão ficou paralítico do lado direito, tendo aprendido a escrever com a mão esquerda para poder continuar a compor música e a emendar alguma da que já tinha escrito. Assim viveu os últimos seis anos da sua vida, valendo-lhe, para se manter, a dedicação do seu discípulo, o micaelense Pe. Jacinto da Ponte, que tomou o seu lugar de organista da Matriz, dando-lhe sempre generosamente, os respectivos honorários.

Durante os 36 anos que viveu nos Açores esteve sempre na ilha de S. Miguel, havendo apenas notícia de ter ido duas vezes à Terceira, onde construiu o órgão da Catedral de Angra do Heroísmo.

O Padre Joaquim Silvestre Serrão morreu a 20 de Fevereiro de 1877, na cidade de Ponta Delgada, em cujo cemitério de S. Joaquim dorme o último sono. Aqui, tem também, um artístico e lindo monumento erguido pela admiração e gratidão dos micaelenses. A vasta obra de música que deixou pertence a duas épocas - a setubalense, a menor e a micaelense, a mais notável.

PAXECO, Óscar, Roteiro do Tríptico de Luciano. Setúbal, Câmara Municipal de Setúbal, 1999.

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