O painel Central tem como figura principal aquela que é, sem sombra de dúvida, entre os setubalenses de todos os tempos, o único de projecção verdadeiramente universal, a insigne Luísa de Aguiar Todi, que no dizer de Reicha deve ser considerada a cantora de todos os tempos e de quem um escritor português contemporâneo, o Dr. Júlio Dantas, disse ser «a diva singular e majestosa que tendo nascido obscuramente em Setúbal, de pais humildes, atravessou a Europa no seu carro triunfal, apaixonou potentados, arrebatou plateias, foi hóspede de Reis e Principies e ofuscada pelo seu próprio clarão (pobre Todi) veio a morrer em Lisboa na manhã de 1 de Outubro de 1833 numa modesta casa da rua que hoje tem o seu nome.
Luísa de Aguiar Todi nasceu em Setúbal, na freguesia da Anunciada, numa casa da actual rua Brasileira, recentemente identificada, de acordo com a tradição oral, no dia 9 de Janeiro de 1753. Baptizaram-na a 30 do mesmo mês e ano. Foi filha do músico do teatro do Bairro Alto, o Professor Manuel José de Aguiar e de D. Ana Joaquina de Almeida. Estreou-se naquele mesmo teatro entre os 14 e 15 anos no Tartufo. Aos 16 casou-se com o violinista italiano que também ali trabalhava, Francisco Xavier Todi.
Em grande parte graças ao marido, Luísa de Aguiar Todi pôde tornar-se rapidamente a notável cantora que assombraria a Europa do seu tempo, defrontando a grande e extraordinária Mara. Em Paris os seus triunfos marcam como grandes acontecimentos artísticos.
Depois de Paris foi a Berlim onde Frederico II a recebeu e aplaudiu, hospedando-a no Palácio Real de Potsdam.
A seguir esteve em S. Petersburgo, onde assombrou a Corte de Catarina II. A Imperatriz, tornando-se sua íntima, cumulou-a de presentes e deferências, fazendo-a, por fim, professor das princesas de suas filhas. Da Rússia veio a Madrid onde o soberano a hospedou no Palácio Real. Igual acolhimento lhe foi dispensado em Viena, no Hanover, na Mogúncia, em Milão, em Veneza, Parma, Nápoles. Enfim por toda a parte lhe tributaram os maiores e mais apoteóticos aplausos.
A França querendo apoderar-se da sua glória chamou-lhe pela boca do rígido e austero Reicha «a cantora da Nação», só porque adentro das suas fronteiras ela alcançou assinalados êxitos.
Luísa Todi atravessou a Europa em autêntica e esplendorosa glória. Séculos decorridos, ela é ainda, no presente, a grande expressão do bel-canto do século XVIII. O seu nome ecoou por todo o velho Continente e ainda fulgura como uma das maiores estrelas, senão a maior, da arte lírica.
Entre os setubalenses é ela, efectivamente, a figura mais expressivamente universal, porque centúrias passadas, o seu nome continua conhecido e celebrado.
Octogenária e vítima de uma congestão passou os últimos anos de vida praticando devotamente a religião e fazendo caridade. Morreu em 1 de Outubro de 1833.
Mestre Joaquim de Vasconcelos termina a sua biografia escrevendo:
«Vicente Lusitano revolucionou a Itália e mundo artístico com uma discussão musical que implica nada menos que a defesa e justificação da arte moderna. Vence o sacro Colégio dos Cardeais, vence perante os sábios mais célebres e artistas mais insignes da Cristandade!...
Marcos Portugal honra a sua terra natal, representando a pátria em Roma, em Viena, em Dresden, em Breslau, em S. Petersburgo, em Paris e dentro mesmo do Instituto de França.
Luísa Todi enfim subjuga a Europa com o poder da sua voz e o mágico encanto de sua natureza artística consubstanciada na máxima perfeição».
in
PAXECO, Óscar, Roteiro do Tríptico de Luciano
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