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quinta-feira, 1 de maio de 2014

"O Povo, Unido, Jamais Será Vencido"


       Vale a pena viver, só para escrever esta reportagem. Vale a pena ser homem para sentir a alegria dum povo quando a sua hora chega inesperadamente. Vale a pena estar aqui para ver o povo na rua, a sorrir.
Foi o 1º de Maio, a Festa dos Trabalhadores.
Era negado aos trabalhadores portugueses festejarem este dia. Durante cinquenta anos o povo sofreu em silêncio as agruras de um regime que fazia do fascismo asqueroso a sua linha de rumo. Nunca aos trabalhadores se reconheceram direitos, somente se exigindo deles um trabalho incansável, no campo ou na oficina, até à exaustão.
O fascismo é horrendo. Massifica. Tortura. Massacra. Oprime. Faz da massa trabalhadora produtiva, o ponto vital de apoio ao capitalismo. De apoio pelas represálias, castigos, acusações, despedimentos, etc. Assim, e contra o mais íntimo da sua vontade, os trabalhadores portugueses foram apoio de uma linha tirânica que deles se servia para oprimir cada vez mais.
De Salazar a Caetano, os trabalhadores nunca foram importantes. Nada de bom se fez para a base produtiva da Nação. E este clima de injustiça só foi possível durante todos esses anos com o apoio da mais sinistra polícia política assassina que a Europa e o Mundo conheceram: a PIDE/DGS, mantida sofregamente por um orçamento fabuloso, com o beneplácito de todo o Portugal capitalista. Das horrendas torturas sofridas pelos trabalhadores às mãos da PIDE/DGS, não nos poderemos esquecer, pois os portugueses aprenderam a conhecer esses agentes do mal à custa do seu sangue e vida. Basta dizer-se, comparados à diabólica PIDE/DGS, os carrascos nazis foram simples amadores.
Mas a hora chegou. A hora da Liberdade que tardava. Essa hora porque cada português ansiava e sabia, no seu íntimo, que havia de chegar. 
Veio tarde, mas chego. Em 25 de Abril deste ano de 1974. Por iniciativa do Movimento das Forças Armadas. Através desse glorioso Movimento, foram restituídas aos portugueses as suas liberdades fundamentais, de que tanto careciam. 
Vale a pena viver nesta terra, para contar o 1º de Maio.

O PRINCÍPIO DA CONCENTRAÇÃO NA PRAÇA DO BOCAGE

Setúbal veio para a rua

Quarta-feira, o mais belo dia dos trabalhadores portugueses.
Setúbal estava diferente. Desde manhã, carros enfeitados de flores passeavam pelas ruas, buzinando insistentemente. A hora era de alegria. Todos os estabelecimentos encerrados, facto inédito. Tabernas, cafés, pastelarias, enfim, tudo o que sempre funcionou aos domingos estava encerrado. Até o Mercado do Livramento! 
Em cada rosto, em cada setubalense, um sorriso, uma rosa ou um cravo. Ou outra flor qualquer. Bandeiras nacionais erguiam-se a cada passo, pelas mãos dos populares. E que belo significado tem a bandeira verde-rubra, desfraldando ao vento, nas mãos do povo… Toda a cidade sorria, todo o povo fazia o V de vitória que já temos como certa. Um feriado jamais vivido, mas que todos se lembravam em silêncio. Silêncio e medo que as nossas gentes tão dolorosamente aprenderam a conhecer durante o domínio fascista no nosso querido Portugal.

Quinze horas – Praça do Bocage

Nunca tal foi visto, nem durante as grandes manifestações feitas ao Vitória.
Não havia chão sem gente, não havia gente sem flor. Nas árvores, candeeiros, janelas, em todo o lado onde o corpo humano pudesse chegar, havia alguém.
Era a grande manifestação do Dia do Trabalhador organizada pelo Movimento Democrático do Distrito de Setúbal.
Homens, mulheres, jovens de ambos os sexos, empunhando dísticos e cartazes onde se liam, entre outros, «Ao fim de 48 anos somos livres», «Abaixo o fascismo», «Vivam as Forças Armadas», «SETÚBAL está com a Junta de Salvação Nacional», «Viva o Partido Comunista Português», «Álvaro Cunhal no Governo», «Os jovens estão com os trabalhadores para um Portugal Democrático, «Sindicatos livres», e muitos outros referentes à situação que o país atravessa. 
Da varanda da Câmara Municipal de onde continuamente se transmitiam canções de José Afonso, elementos do M.D.D.S. iniciaram os «vivas» a que a multidão correspondeu inteiramente. 
Iniciou-se depois o desfile pelas ruas, após se ter guardado um minuto de silêncio em memória dos anti-fascistas que faleceram. A manifestação percorreu a Av. Todi, Fontainhas, Largo das Areias, Bairro da Conceição, Av. Duarte Pachedo, Av. 5 de Outubro, Fonte Nova, regressando à Praça de Bocage.

No regimento de Infantaria 11

Quando da passagem dos manifestantes pelo Regimento de Infantaria 11, unidade aquartelada em Setúbal que aderiu ao Movimento, foram vitoriados os briosos e bravos militares que se encontravam nos muros e janelas, tendo sido aclamados vibrantemente. Nos rostos dos que envergavam a farda verde-azeitona, sorrisos de contentamento e agradecimento por saberem ter o carinho da população simpatia que nunca lhes foi negada. 
Para eles, os manifestantes ofereceram imensas flores, que bem contrastavam com as suas fardas. Flores, símbolos de liberdade, da Liberdade que eles ajudaram a conquistar.
O ENTUSIASMO DO JOSÉ PEDRO «IMPULSIONANDO-O»
PARA JUNTO DE BOCAGE

Entusiamo perigoso

Enquanto na Praça de Bocage se aguardava o regresso dos manifestantes, um jovem de 18 anos, pescador, de seu nome José Pedro, tentou e conseguiu colocar-se no cimo da estátua de Bocage. A massa compacta seguiu em silêncio aquele perigoso acto de entusiasmo, estando iminente, para a sua descida, a utilização de uma escada «Magirus». No entanto, tal não foi necessário, pois o jovem conseguiu descer sem se molestar. 
Pelo microfone foi dito que actos destes, pelo seu risco, não estão no espírito do Movimento.

Encontros alegres

Na varanda dos Paços do Concelho pudemos presenciar verdadeiras explosões de alegria, entre todos os democratas presentes. Abraços, palmas, e até lágrimas. Como nota dominante, a chegada de Jorge Luz, exilado em França, e Adilo Costa, candidato pela CDE nas últimas «eleições» e que recentemente saiu do cárcere da ex-PIDE/DGS, em Caxias. E muitos outros. 
Foi extraordinariamente belo ver a presença de muitos homens que, pelo seu amor à Patria e ao povo, tiveram de fugir e sofrer. Felizmente passou…

Discursos políticos
No regresso, com a Praça talvez ainda mais repleta de povo, foram proferidos discursos alusivos ao Movimento das Forças Armadas, de saudação à Liberdade e referentes ao 1.º de Maio. Intervieram, Carlos Luís, Adilo Costa, Joaquina Soares, Abílio Ferreira, António Santos, Tito Soeiro, Dimas Pereira, a quem a população aclamou com vibração.
Ao som de uma banda de música, todo o povo entoou o Hino Nacional, dando o verdadeiro significado a esta jornada de patriotismo.

A Bandeira do Partido Comunista na Câmara

Inédito, poderemos considerar o facto do que foi visto durante as celebrações do 1º de Maio. 
Da varanda da Câmara Municipal de Setúbal, que algumas vezes serviu para frustradas manifestações ao regime fascista que nunca teve o apoio popular, ondulava, entre outras, a Bandeira do Partido Comunista Português, distinguindo-se pelo seu vermelho-vivo.
Nunca a foice o martelo pensaram poder alguma vez aparecer ali, aos olhos do povo. 
Os Partidos Comunista, de Álvaro Cunhal e Socialista de Mário Soares, foram vibrantemente aplaudidos pela massa trabalhadora.

Um nome

Setúbal, nesta horas, muito deve ao Movimento Democrático do Distrito de Setúbal.
Dias e noites, muitas vezes sem comer, têm ali sido gastos pelos convictos democratas. Lá se elaboraram discursos, programa de trabalhos, panfletos, dísticos, e tantas outras coisas necessárias ao conhecimento público nesta hora.
Sabemos que todos trabalharam por gosto, pela alma, pelo amor à Pátria. Sabemos que não gostam de nomes em saliência. E há tantos…
Mesmo assim, e sabemos que vamos ferir a sua modéstia, não queremos deixar de assinalar o trabalho incansável do Abílio Ferreira, em prol do M.D.D.S.. Ele tem sido a alma de tudo, entregando-se dia e noite, até à exausão que nunca chega, com risco da própria saúde.

O Povo

Não poderíamos deixar, ao falar no 1º de Maio, de frisar a presença do povo.
Com civismo, correcção, participando sempre, esteve à altura da festa. Festa que era sua, do povo que trabalha. 
Quando as circunstâncias exigem, o povo sabe comportar-se.
Para a massa trabalhadora, para todos os presentes no 1º de Maio o nosso «BRAVO PORTUGUESES». 

A terminar

Este dia não terminou. Não terminará enquanto houver um português vivo. Enquanto os homens quiserem.
Repetimos: Valeu a pena viver, para ver, para poder escrever, sobre o 1º de Maio. 
Agora, sim. Vale a pena escrever. Do povo para o povo.
Que o dia dos trabalhadores seja sempre comemorado condignamente, com feriado nacional. Os portugueses assim o querem.
POR UMA IMPRENSA LIVRE.
VIVA O MOVIMENTO DAS FORÇAS ARMADAS.
VIVA PORTUGAL!
ASPECTO PARCIAL DA MULTIDÃO

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