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sábado, 26 de abril de 2014

Libertação da Liberdade

Fazendo o ponto da situação
LIBERTAÇÃO DA LIBERDADE

Esfregamos os olhos e ainda nos custa a crer no que vimos e ouvimos. 

O choque da surpresa motivou a natural emoção de que ainda não estamos totalmente refeitos.

Mas era verdade. O inacreditável aconteceu. Ninguém, ou pouca gente, acreditaria ser possível qualquer movimento que viesse alterar a situação decorrente há cerca de cinquenta anos. 

Tudo se pensaria dominado e controlado, ainda que com alguma instabilidade. Como o estrebuchar do estrangulado que, enquanto o não asfixiam totalmente se vai sempre movimentando sob as garras do seu estrangulador. 


Mas… á sempre um mas. Eis senão quando, um dia, aliás uma noite as forças armadas fazem eclodir um «Movimento de Libertação» que, 24 horas, é período bastante para oficialmente se declara normalizada a situação.

Este movimento teve, como seria evidente, uma causa. E essa causa foi tornada pública ao fim da manhã do próprio dia 25 de Abril de 1974, através do seguinte comunicado transmitido à Imprensa:
«Considerando que, ao fim de treze anos de luta em terras do Ultramar, o sistema político vigente não conseguiu definir, concreta e objectivamente, uma política ultramarina que conduza à paz entre os Portugueses de todas as raças e credo;

Considerando o crescendo clima de total afastamento dos Portugueses em relação às responsabilidades políticas que lhes cabem como cidadãos, em crescente desenvolvimento de uma tutela de que resulta constante apelo a deveres com paralela denegação de direitos;

Considerando a necessidade de sanear as instituições, eliminando do nosso sistema de vida todas as ilegitimidades que o abuso do poder tem vindo a legalizar; 

Considerando finalmente que o dever das Forças Armadas é a defesa do País, como tal se entendendo também a liberdade cívica dos seus cidadãos;

O Movimento das Forças Armadas, que acaba de cumprir com êxito a mais importante das missões cívicas dos últimos anos da nossa História, proclama à Nação a sua intenção de levar a cabo, até à sua completa realização, um programa de salvação do País e de restituição ao Povo Português das liberdades cívicas de que vem sendo privado. Para o efeito entrega o Governo a uma Junta de Salvação Nacional a quem exige o compromisso, de acordo com as linhas gerais do Programa do Movimento das Forças Armadas que, através dos órgãos informativos, será dado a conhecer à Nação, de no mais curto prazo consentido pela necessidade de adequação das nossas estruturas, promover eleições gerais de uma Assembleia Nacional Constituinte, cujos poderes por sua responsabilidade e liberdade na eleição, permitem ao País escolher livremente a sua forma de vida social e política. 

Certos de que a Nação está connosco e que, atentos os fins que nos presidem, aceitará de bom grado o governo militar que terá de vigorar nesta fase de transição, o Movimento das Forças Armadas apela para a calma e civismo de todos os Portugueses e espera do País adesão aos poderes instituídos em seu benefício.

Saberemos deste modo honrar o Passado no respeito pelos compromissos assumidos perante o País e por este perante terceiros. E ficamos na plena consciência de haver cumprido o dever sagrado da restituição à Nação dos seus legítimos e legais poderes.»

Declarados os pontos fundamentais em que se pretende dar aos portugueses de menos de 50 anos uma oportunidade soberana de decidirem, por si, o que melhor convém aos interesses da Nação o que vale para dizer do próprio povo que é a sua razão de existir. 

Sempre que se ousadamente (em silêncio) se ventilasse a hipótese duma mutação, era ponto de dúvida o resultado sanguinário que desse movimento naturalmente havia de sair como consequência da impreparação cívica de um povo oprimido nos seus mais fundamentias direitos de liberdade e opinião. Um povo arredado de liberdade associativa. Porque controlado.

Mas as virtude no nosso povo estavam ainda por definir. E se, temos de reconhecer, o «Movimento das Forças Armadas» se realizou com a perícia e objectividade que os resultados testemunham, não menos verdade é que grande herói desta inolvidável jornada foi inegavelmente o BOM POVO PORTUGUÊS. Um povo que, uma vez mais, escreve em letras de oiro uma página da gloriosa História de Portugal. Dando ao mundo inteiro exemplar noção de civismo. Sabendo aceitar a situação inacreditável, com a naturalidade e relativa calma dos povos sobejamente amadurecidos. Mais serenamente do que muitos povos chamados evoluídos. Exuberante nas manifestações ordeiras. Notável pela tranquilidade de reacções. Cremos que podemos considerar inédito na história da humanidade a consumação de uma revolução sem derramamento de sangue. Sem violência. Na verdadeira paz dos justos.

Estas e outras razões são mais do que bastantes para que o dia 25 de Abril de 1974 fique na História e na Memória de todos os bons portugueses que amam, acima de tudo e mais do que tudo a sua Pátria.

Esta a data que virá a ser o marco do virar da página. Um virar de página que traz a TODOS OS PORTUGUESES uma maior responsabilidade na decisão que vierem a tomar com vista ao futuro do país a sua população. Com vista à salvaguarda dos direitos essenciais e fundamentais que interessa restaurar e não mais perder. Devendo saber aproveitar o raro ensejo que agora a TODOS é dado através da:

Proclamação da Junta de Salvação Nacional:

Em obediência ao mandato que acaba de lhe ser confiado pelas Forças Armadas, após o triunfo do Movimento, em boa hora em levado a cabo pela sobrevivência nacional e pelo bem-estar do Povo Português, a Junta de Salvação Nacional a que presido, constituída por imperativo de assegurar a ordem e dirigir o País para a definição e consecução de verdadeiros objectivos nacionais, assume perante o mesmo o compromisso de:

- Garantir a sobrevivência da Nação como Pátria soberana no seu todo pluricontinental;

- Promover desde já a consciencialização dos Portugueses permitindo plena expressão a todas as correntes de opinião, em ordem a acelerar a constituição das associações cívicas que hão-de polarizar tendências e facilitar a livre eleição, por sufrágio directo, de uma Assembleia Nacional Constituinte e a sequente eleição do Presidente da República;

- Garantir a liberdade de expressão e pensamento, abster-se de qualquer atitude política que possa condicionar a liberdade da eleição e a tarefa da futura Assembleia Constituinte, e evitar por todos os meios que outras forças possam interferir no processo que se deseja eminentemente nacional;

- Pautar a sua acção pelas normas elementares da Moral e da Justiça, assegurando os direitos fundamentais definidos em declarações universais e fazer respeitar a paz cívica, limitando o exercício da autoridade à garantia da liberdade dos cidadãos;

- Respeitar os compromissos internacionais decorrentes dos tratados celebrados;

- Dinamizar as suas tarefas em ordem a que, no mais curto prazo, o País venha a governar-se por instituições de sua livre escolha;

- Devolver o Poder às instituições constitucionais, logo que o Presidente da República eleito entre no exercício das suas funções.

A 1.30 horas do dia 26 de Abril de 1974, o General António de Spínola, na qualidade de presidente da Junta de Salvação Nacional, leu a proclamação acima a toda a Nação.

Assumiu publicamente um grande compromisso. Que o povo, naturalmente, espera dever cumprido. Pois em nome e para defesa desse mesmo povo a revolução se fez.

Vão ser restauradas as associações cívicas, como vai proceder-se à consciencialização política desse mesmo povo.

Irão surgir os vários partidos com as suas ideologias próprias. Um direito legítimo que não deve retirar-se. Fundamental é que cada partido político não esqueça que acima de todos os direitos estão os do povo e, com ele, os da Pátria. Que se deseja LIVRE E INDEPENDENTE. 

Não se esqueça que a maior vitória de um partido há-de ser a da VITÓRIA DA HONESTIDADE E DA COERÊNCIA de princípios e objectivos.

Não se esqueça que a alienação de massas não beneficia quem quer que seja. E que todos os passos em falso são um somatório ao terreno que já se perdeu na corrida para o desenvolvimento humano-económico-social.

Portanto, todos os minutos têm de ser aproveitados e recuperados os perdidos. Não podemos dar-nos a luxos de desperdícios de tempo. O momento é para começar HOJE Já, a meditar e a arranjar a consciencialização suficiente que faça de Portugal um paíss Portugueses livres de todas as peias. Para que, séculos adiante, as gerações vindouras possam, como nós, gritar do fundo da alma: VIVA PORTUGAL!

G. Figueira

In O Setubalense, 26 de Abril de 1974

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